Por Kayk Oliveira
Desde o início do segundo mandato do Governo Dilma Rousseff, temos
acompanhado uma sequência de pautas polêmicas entrarem em votação no congresso
nacional. Recapitulando, foi matéria de votação a redução da maioridade penal, o
projeto de lei que amplia de maneira irrestrita a terceirização, a renegociação
do índice de correção das
dívidas estaduais e municipais com
a União – que na prática força Dilma reduzir as dívidas dos Estados, gerando
menor arrecadação para União e, consequentemente, menor investimento do Governo
Federal em serviços essenciais para população. Nesse momento, o que assombra o
campo progressista e os profissionais de saúde diz respeito à proposta de
emenda constitucional (PEC 451/2014) de autoria do presidente da câmara, sempre ele, Eduardo Cunha PMDB
– RJ. A respectiva emenda traz para o cenário social duas questões vitais para
manutenção da democracia no Brasil: a primeira concerne ao investimento e
financiamento do SUS; a segunda toca o financiamento privado de campanha e o
condicionamento do debate acerca das políticas públicas.
A PEC 451/2014
apresenta nas suas entrelinhas um discurso
que soa ao cidadão brasileiro como canto da sereia. Dito diretamente, a emenda
propõe que toda empresa seja obrigada a pagar planos de saúde privados para
seus funcionários. Seria lindo se a lógica subjacente à PEC não
fosse tão perversa. Antes de explicitá-la, é interessante introduzir duas
questões para reflexão: Quem perde com a PEC 451/2014? Quem ganha com a PEC
451/2014? Começamos pela segunda: ganham os planos de saúde que terão o quadro
de clientes inflado. A rigor, os planos de saúde, como demonstrado e alertado
por Passos[1]
em artigo publicado na revista Cartamaior,
foram responsáveis pela doação de 52 milhões de reais para 131 candidaturas de
23 partidos políticos e, em particular, pela doação de 250.000 mil reais –
Bradesco Saúde – á candidatura de Eduardo Cunha autor da
proposta de emenda constitucional. Diante desse cenário, cabe retomar a
primeira questão para afirmar que quem perde com a PEC são os cidadãos
brasileiros uma vez que o Estado é desobrigado a investir no SUS, impedindo atendimento
de qualidade para população e fragilizando ainda mais sua política de
financiamento cujas estruturas foram profundamente abaladas desde a perda dos
40 bilhões de reais ocasionados pela derrubada da CPMF – ainda no governo Lula
2008.
O que essa lógica de proposição de emenda constitucional apresentada por
Cunha esconde são os fundamentos que regulam o funcionamento do congresso
nacional e as variáveis que pautam e condicionam o debate acerca das políticas
públicas no país. De maneira mais específica, a grande maioria dos políticos
tem campanhas financiadas por empresas privadas. Ora, não há doação privada de
recursos desinteressada. Após eleito, chegam a fatura e as exigências aos
políticos por parte dos financiadores. Esse é apenas um dos aspectos
da estrutura de corrupção no Brasil. Nessa lógica, nos interessa enfatizar o
quanto que o financiamento privado pauta e orienta os debates acerca das
políticas públicas no país. No caso de Eduardo Cunha o exemplo é claro, teve a
campanha financiada pelo Bradesco Saúde e tem desde então encabeçado o
movimento em favor do desmantelamento do SUS. Lógica nociva que prioriza o
interesse privado em detrimento do púbico.
Por fim, cabe
destacar que toda essa problemática salienta uma vez mais a importância de se
debater e defender uma urgente reforma política. A proibição do financiamento
privado de campanha e, em contrapartida, a revindicação em favor do
financiamento público são bandeiras das quais os profissionais de saúde não
podem se furtar. Essa clareza e disposição para travar o debate nos diferentes
espaços que cada um ocupa fornece o melhor antídoto contra todo um discurso que
vem se desenvolvendo no Brasil e que ameaça conquistas e direitos históricos.
Se consolidar os avanços sociais dos últimos anos tem sido um desafio cotidiano
do povo brasileiro, é certo também que retroceder não deve fazer parte dos
planos, jamais. Em meio a esse cenário de interesses antagônicos, a democracia
precisa ser defendida em vista da radicalização e manutenção dos direitos.